A TRAIÇÃO DE JUDAS

Em uma saleta de alvenaria rústica, sem mesas nem cadeiras, apenas caixas e cestos, Jesus em sua última ceia é um dos três que estão sentados em caixas, os outros distribuídos pelo chão aguardam palavras de sabedoria.

Ao lado do Mestre pão e um jarro de vinho; ao anunciar sua partida muitos se entristecem; de certo modo sabiam que não ficaria por muito tempo entre eles.
Em certo momento o espanto, diante da revelação de uma traição que sofreria.
Olhares desesperados a procura do traidor em todos os apóstolos, incluindo Judas.

O pão umedecido seria dado a um dos apóstolos, e este será o traidor; todos prestam atenção nas mãos do Mestre, mas Ele não umedece nenhum dos pedaços de pão com o vinho; a distribuição é feita de forma aleatória; o receio toma conta dos apóstolos no momento de levar o alimento à boca.

Judas leva seu pão à boca e o sente umedecido, fica paralisado, e como que sentindo a boca lhe queimar, engole o pão sem ao menos mastigá-lo, fica confuso, não mais consegue prender sua atenção no Mestre que olha com discrição, sabendo que ele é o escolhido.

Durante os momentos que se seguiram Judas continha as lágrimas, tentando não passar aos outros o ocorrido; desesperado se contém, teria de entregar o amigo, pois seria este um importante desígnio de Deus.

Por diversas vezes durante aqueles minutos, Judas pensou em desistir do grupo, desaparecer no mundo, negar ter conhecido o Mestre para não o trair; mas o olhar de Jesus o paralisava, não conseguia levantar para fugir da futura situação, pensava até em morte, mesmo sabendo ser pecado tal gesto.

Conteve-se até o fim dos comentários de Jesus; levantou-se e foi a um aposento ao lado pode extravasar seu desespero da verdade; entregar quem mais ama aos perseguidores.

Sua cabeça estava quase o tornando um insano, quando o Mestre vem lhe falar.
–Sua atitude, diz Jesus, é de puro amor a mim, mas você deve provar o amor a Deus, fazendo o que tem de ser feito.
Sem dizer nada, Judas implorava com os olhos para poupá-lo desta tarefa. Sentindo o desespero do irmão, o Mestre tenta acalmá-lo colocando-o a par dos futuros acontecimentos, lembrando-o de seu preparo para o que iria passar, e principalmente da importância deste gesto para o futuro da humanidade.

Em silencio o futuro “traidor” olha para o vazio e Jesus continua.
-Sei que tens grande amor por mim, jamais me magoarias, e é exatamente por esta dedicação que foste escolhido, o amigo de confiança que prova o amor que sente, fazendo aquilo que lhe é pedido, mesmo não concordando.

Judas se retira do local e anda pelas ruas e becos sem destino, observa mendigos, soldados, mulheres sofridas, senhores bem situados, viajantes e todo tipo de pessoa que encontra; a cada instante um ensinamento do Mestre lhe invade, algo enlouquecedor, um martírio em sua prisão emocional.

Durante horas perambula até se dar conta que está frente ao algoz de seu Mestre. Quase sem pensar, talvez por estar tomado da necessidade do dever a cumprir faz a oferta, inventa motivos para o gesto e chega a aceitar recompensa, talvez para se sentir o traidor que julga ter se tornado; em sua mente já transtornada pelo dever cumprido trinta moedas seriam só símbolos para fazê-lo ser lembrado.

Judas nunca foi o traidor, pois se não fizesse o que o Mestre pediu, aí poderia ser o traidor dos desígnios de Deus e do amigo que tanto amava.

Amigo é aquele que nos faz o que mais desejamos, mesmo que isto doa; e Judas provou o imenso amor ao amigo e sua dedicação ao Criador.

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